sábado, 3 de novembro de 2012

MPE pede a dissolução da Ativa.

O Ministério Público do RN impetrou Ação Civil Pública na Justiça estadual propondo a dissolução, liquidação e intervenção judicial na organização não-governamental (ong) Ativa, prestadora de serviços à Prefeitura de Natal. A ação foi proposta após o MPE identificar possíveis irregularidades nos convênios mantidos entre a organização não-governamental e a Prefeitura.

Magnus NascimentoAtiva é uma organização não governamental com um único convênio, no valor de R$ 1,1 milhão/mês, com a Prefeitura do NatalAtiva é uma organização não governamental com um único convênio, no valor de R$ 1,1 milhão/mês, com a Prefeitura do Natal

O processo contra a Ativa ocupa 13 volumes, mais de 12 mil páginas, e tramita desde o dia 29 de outubro na 17ª Vara Cível, onde aguarda análise e sentença da juíza Divone Maria Pinheiro. A petição inicial, elaborada pelos promotores Rodrigo Martins da Câmara e Hellen de Macêdo Maciel, detalha a linha de investigação adotada pela promotoria do Patrimônio Público, que atribuiu à causa o valor de R$ 1 milhão.

Na denúncia, o MPE destaca transcrições de depoimentos de ex-funcionários da Ong e documentos que embasam as suspeitas levantadas no Inquérito Civil Público nº 001/12, instaurado para averiguar possíveis fraudes detectadas pelo promotores, entre elas desvio de finalidade da instituição; contratações irregulares de funcionários; ausência de controle no ponto dos contratados para a prestação de serviços aos órgãos públicos conveniados; variação de remuneração para funcionários que exercem os mesmos cargos e funções; irregularidades em licitações e pagamentos; e ausência de controle dos recursos recebidos a títulos de convênio.

A Ação Civil Pública ainda questiona o fato do presidente da Associação ser nomeado pelo chefe do Executivo Municipal, detalhe que descaracteriza a independência na gestão da entidade e comprova o vínculo estreito e sobrevivência atrelada ao poder público. O valor original do convênio da Prefeitura de Natal com a Ativa era de R$ 910 mil/mês. O convênio é, exclusivamente, com a Semtas, mas até o início do mês de outubro o repasse já era de R$ 1,15 milhão devido vigência de contrato para administração das quatro Casas de Passagem. Em agosto, a Ativa ainda prestava serviço à Fundação Capitania das Artes no valor de R$ 100 mil.

O MPE aponta, entre as suspeitas relacionadas para a Justiça, a existência de "funcionários fantasmas", que somariam 35% do pessoal contratado pela ong, e gastos com salários que ultrapassam em 150% as receitas da Ativa. Outra irregularidade levantada é a possibilidade das indicações de funcionários serem feitas por secretários municipais e políticos ligados à administração municipal. 

Entre as irregularidades com a gestão de pessoal, o relatório elaborado pelos promotores atribui a alguns funcionários o recebimento de horas extras que totalizam carga horária de 468 horas/mês - ou jornada diária de 15h30 sem direito a nenhum dia de descanso. "Uma quantidade de horas de trabalho extraordinária não compatível com a legislação vigente, nem tampouco com a condição do ser humano para o trabalho", diz o documento do MPE.

Também foram registrados um passivo acumulado, até 31 de julho, que ultrapassa os R$ 5,1 milhões, e a ausência de recolhimento de impostos e tributos federais e previdenciários e falta de pagamento de rescisões trabalhistas.

Bate-papo - Alcedo Borges - secretário da Semtas

O secretário Municipal de Trabalho e Assistência Social, Alcedo Borges de Melo Júnior, é citado em diversas ocasiões na petição do Ministério Público como sendo o responsável por justificar "quantidade expressiva de processos" que fundamentam a contratação de pessoal. De acordo com parecer contábil juntado ao  documento elaborado pelos promotores do Patrimônio Público, Rodrigo Martins da Câmara e Hellen de Macêdo Maciel, os ofícios da Semtas destinados à Ativa, assinados por Alcedo Borges, "solicitam contratações de determinadas pessoas" e apresentam o nome e o valor líquido da remuneração.
O titular da Semtas respondeu, por e-mail, questionamentos sobre o assunto e prestou os seguintes esclarecimentos:

Como funciona/funcionava a contratação dos prestadores de serviço lotados na Semtas através da Ativa?
Todos os funcionários da Ativa que prestam serviço à Semtas o fazem por meio de convênio assinado ainda na última gestão, especificamente no ano de 2008, e que vem sendo aditivado desde então para execução de Programas, projetos e ações fundamentais para a efetivação pela das políticas públicas que contemplam a pasta que represento.

Rodrigo SenaEntrevista Alcedo Borges - secretário da SemtasEntrevista Alcedo Borges - secretário da Semtas

Há algum direcionamento quanto aos nomes dos contratados?

A maioria dos prestadores de serviço é formada por profissionais que já possuem anos de trabalho dedicados à Ativa, e consequentemente para a Prefeitura por meio do convênio. São pessoas que já trabalham há 15, 20 anos para na Organização. E durante nossa gestão, diante da necessidade técnica, foram solicitados alguns cargos específicos com qualificação determinante para  efetivação de nossas ações.

Quais os programas assistenciais mantidos pela Semtas possuem pessoal ligado à Ativa?
Os funcionários da Ativa fazem parte do quadro de prestadores de serviço dos Departamentos de Proteção Social Básica (DPSB) e Especial (DPSE), no apoio administrativo, e ainda nas ações ligadas a pasta do Trabalho.

Quantas pessoas da Ativa prestam serviços atualmente para a pasta de Assistência Social?
Hoje, temos em torno de 550 profissionais da Ativa na prestação de serviços na Semtas.

A Semtas tem controle quanto ao expediente dessas pessoas? Folha de ponto, horas extras, diárias?
Há mais de um ano trabalhamos em um processo licitatório para a implementação de controle de ponto eletrônico na Semtas. Realmente não é uma tarefa fácil, mas estamos sempre nos dedicando para aprimorar essa importante questão. Contudo, acreditamos também na responsabilidade de cada profissional da Ativa que sabe a relevância de seu trabalho e talento para o desenvolvimento das ações que envolvem a assistência social do município.

Irregularidades apontadas

. O valor atual do convênio da Ativa com a Semtas é de R$ 910 mil
. Os gastos com pessoal representa 150% da receita total da Associação
. O déficit financeiro ultrapassa os R$ 5,1 milhões
. O índice de supostos funcionários fantasmas bate na casa dos 35%
. Nenhum dos programas assistenciais elaborados pela Ativa estão em desenvolvimento, apenas os funcionários que trabalham no cadastro de notas fiscais do Programa Cidadão Nota 10 têm função identificada
. Atualmente a Ativa possui cerca de 600 funcionários
. Os 155 funcionários que atuavam nas quatro Casas de Passagem e foram demitidos no final de setembro ainda não receberam o pagamento da rescisão trabalhista
. O pagamento dos salários de setembro ainda não foi realizado.

ONG tem relação com fraudes da Assepsia

Dentro do emaranhado de irregularidades encontradas pelo Ministério Público no funcionamento e na gestão da Ativa, as digitais de Rychardson de Macedo Bernardo, ex-diretor do Ipem, pivô da Operação Pecado Capital, aparecem com destaque. Não é a primeira vez. Em setembro deste ano, o MPE denunciou Rychardson e mais quatro pessoas, entre elas o pai, o irmão e a noiva do ex-diretor do Ipem, por peculato e formação de quadrilha por supostas fraudes na Ativa. Ao pedir a dissolução da ONG, o MPE voltou a citar o assunto.

Na petição em que se pede o fim da Ativa, os promotores do Patrimônio Público são categóricos em afirmar que "ficou claro que o fisiologismo outrora reinante naquele órgão (IPEM) havia migrado para a ATIVA". A Operação Pecado Capital investiga fraude em licitações, concessões de diárias indevidas, cobrança de propina, a existência de funcionários fantasmas, entre outras irregularidades. Na ação criminal contra Rychardson, a trilha é a mesma: "a quadrilha atuava mediante apropriação de cheques destinados ao pagamento de contratos de fornecimento de bens e serviços para ATIVA, executados ou não, como também de outros emitidos em favor de terceiros alheios à entidade". 

Outro ponto presente na investigação contra Rychardson é  a suspeita de lavagem de dinheiro.  "Foi operacionalizada por todos os denunciados a lavagem do dinheiro auferido ilicitamente, seja através da criação e funcionamento de empresas em nome de "testas de ferro" e familiares de Rychardson de Macedo Bernardo", aponta o Ministério Público Estadual.

Recomendações

A partir das possíveis irregularidades constatadas na investigação conduzida pela promotoria do Patromônio Público, a Ação Civil Pública encaminhada pelo Ministério Público à Justiça sugere as seguintes providências:

1. Afastamento do atual presidente da Ativa, Bruno Anderson da Costa, e indicação de interventor para gerir a instituição até a dissolução e liquidação da entidade;

2. Que o interventor apresente, em 30 dias, relatório preliminar com a situação financeira e patrimonial da Ativa;

3. Autorizar acesso irrestrito ao MP às informações e documentos bancários, fiscais e contábeis;

4. Permitir o livre acesso do MP aos setores da Semtas e da Funcarte, onde existam documentos relativos aos convênios firmados entre a Associação e os dois órgãos da administração municipal;

5. Citar os requeridos para, querendo, contestarem a presenta Ação, sob pena de revelia;

6. Afastar, em definitivo, o presidente e os superintendentes (indicados como réus do processo) da Ativa;

7. Decretar, por sentença, a dissolução e liquidação da Ativa.